Cientistas brasileiros usam canto e DNA para identificar nova perereca
no Cerrado
Paula
Adamo Idoeta - @paulaidoetaDa BBC Brasil em São Paulo
28 setembro 2017
Pithecopus araguaius
foi identificada no Mato Grosso por pesquisa de campo que começou em 2010
(Foto: Divulgação)
Cientistas brasileiros anunciaram a descoberta de uma nova espécie de
anfíbio no Cerrado, o que evidencia, segundo eles, o potencial ainda
inexplorado (e ameaçado) desse bioma no Centro-Oeste do Brasil.
A perereca Pithecopus
araguaius foi primeiro avistada pelos pesquisadores - ligados às
universidades Unicamp, em São Paulo, e Federal de Uberlândia (UFU), em Minas
Gerais - em estudos de campo em 2010.
Desde então, foi possível confirmar
que se tratava de uma nova espécie graças a extensos estudos de DNA e análises
morfológicas (da aparência do animal), além de dados acústicos dos sons
emitidos pelo anfíbio, distintos dos emitidos até mesmo por pererecas do mesmo
gênero Pithecopus.
"O canto serve para que a fêmea reconheça o macho da mesma espécie.
Isso nos ajudou a diagnosticar que era (uma espécie) diferente das espécies
irmãs", explica à BBC Brasil o taxonomista Felipe Andrade, um dos autores
da pesquisa - recém-publicada no periódico científico Plos One - ao lado de
Isabelle Aquemi Haga, Daniel Pacheco Bruschi, Shirlei Recco-Pimentel e
Ariovaldo Giaretta.
Além disso, os pesquisadores notaram
que a araguaius tem a cabeça
e o corpo de tamanho um pouco menor que suas irmãs do gênero Pithecopus e um padrão
diferente (que os cientistas chamam de não reticulado) de manchas no corpo.
Há, agora, 11 tipos de Pithecopus documentados,
sendo o araguaius o mais novo
deles. Algumas pererecas desse gênero preferem altitudes mais elevadas, o que
também as diferencia da araguaius, que habita terras
baixas.
"O reconhecimento da Pithecopus
araguaius é importante para o conhecimento da riqueza de anfíbios e
diversificação de padrões nessa região", diz trecho do artigo publicado no
site da Plos One.
Perereca
recém-descoberta se diferencia de suas irmãs por tamanho menor da cabeça e do
corpo e diferenças no padrão de manchas; acima, registro dos cientistas dela
vista de cima e de baixo (Foto: Divulgação)
Bioma a ser conhecido
A araguaius foi
descoberta na cidade de Pontal do Araguaia, no Mato Grosso, à beira do rio
Araguaia - daí seu nome. Posteriormente, os cientistas documentaram a
existência da nova espécie também na Chapada dos Guimarães e na cidade
mato-grossense de Santa Terezinha.
"A descoberta mostra que em 2017 ainda temos espécies a serem
descritas no Cerrado, uma região com alto índice de biodiversidade e sob forte
impacto da ação humana", afirma Andrade.
Seu orientador, Ariovaldo Giaretta, acrescenta à BBC Brasil que o fato
de essa região do Brasil estar sob pressão - sobretudo pela expansão do
agronegócio - pode colocar em risco eventuais descobertas de outras espécies.
"Por acaso achamos essa nova espécie. Quantas outras podem existir?
E não temos ideia de o que está sendo perdido nas áreas (de Cerrado) que estão
sumindo", diz Giaretta. "Se novos vertebrados ainda estão aparecendo
(nas pesquisas), pode haver outras criaturas vivas - invertebrados, plantas.
(...) É estarrecedor que (muitas áreas) estejam virando pasto para boi."
No estudo, os pesquisadores citam o Cerrado como "um dos mais
ameaçados hotspots da Terra, sobretudo pela perda de hábitats por conta do
desenvolvimento urbano e agrícola".
E a própria araguaius pode estar
sob perigo de extinção, por ser uma perereca que habita áreas baixas e,
portanto, de interesse do agronegócio.
"Ainda precisamos de muitos esforços para conhecer nossa
biodiversidade do Cerrado e mais ainda da Amazônia", opina Andrade.
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