Cheia no Pantanal
Um
fenômeno natural, até quando?
Postado em 09 de Outubro de 2014.
Muito antes dos pesquisadores anunciarem a cheia
extraordinária deste ano, ribeirinhos do Pantanal já sofriam com seu impacto.
Muito antes dos pesquisadores anunciarem a cheia
extraordinária deste ano, ribeirinhos do Pantanal já sofriam com seu impacto,
pois em algumas regiões a inundação dos rios foi maior que a de 2011, ano em
que os prejuízos socioeconômicos para a população pantaneira e fazendeiros
foram significativos.
Em
Cáceres, no Mato Grosso, as águas alcançaram níveis superiores ao dos últimos
três anos, assim como na confluência dos rios Paraguai e São Lourenço, no Mato
Grosso do Sul, onde em maio, foi registrada a marca de 6,30 metros, sete
centímetros a mais que o pico da última grande cheia na região, que foi de
6,23.
Através
da análise de dados sobre a situação dos rios nas cabeceiras, das chuvas que
caiam na região norte do Pantanal e também das situações relatadas por
moradores das comunidades que vivem na região, técnicos da ONG Ecoa já previam
que ocorreria uma inundação anormal.
A partir
deste diagnóstico, em fevereiro foi iniciado um trabalho preventivo junto das
comunidades, com o objetivo de minimizar os efeitos de uma cheia atípica.
Porém, não foi suficiente para a proteção dos grupos de maneira integral, pois
os sistemas de alertas para estes eventos climáticos extremos ainda são
insuficientes.
De acordo
com Edna Da Silva Amorim, moradora da Barra do São Lourenço, comunidade que foi
assolada com a cheia de 2011, muitos moradores, apesar de as águas já terem
baixado, ainda estão sofrendo com os impactos da cheia deste ano.
“Quando
veio a cheia eu ainda ‘tava’ construindo minha casa, nem tinha terminado e veio
a cheia e a gente teve que ficar aqui no ‘tablado’ e os outros foram lá para o
aterro, agora eu estou reconstruindo minha casa em uma região mais alta
né?,” disse a moradora com receio de que sua casa seja invadida pelas águas
novamente.
Os locais
mais altos da comunidade são as melhores alternativas durante o período de
enchente, o principal deles é o aterro do Socorro, um direito que só foi
conquistado após 20 anos da expulsão da comunidade para a criação de uma
Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN).
André
Luiz Siqueira, Diretor Presidente da Ecoa, explica que o direito da comunidade
de uso dessa região, foi graças a um processo para a identificação de terra da
União em propriedade antes considerada privada, mas que através de um
georreferenciamento de precisão, feito pela Secretaria do Patrimônio da União
(SPU), a pedido do Ministério Público Federal (MPF), concluiu-se que área em
questão se trata de “ilha em faixa de fronteira”, o que, segundo a
Constituição, é terra pública.
“Com este
reconhecimento a Associação da Comunidade recebeu um Termo de Autorização de
Uso Sustentável Coletivo (TAUS Coletivo), que permite que os ribeirinhos usem –
de modo consciente e de acordo com a legislação ambiental – os recursos
naturais da área, conhecida pelos moradores como Aterro do Socorro, além é
claro de poderem se se abrigar no local durante o período de cheia, esta é uma
das maiores conquistas para aquelas populações,” ressalta André.
Vazão
lenta
Muito antes dos pesquisadores anunciarem a cheia
extraordinária deste ano, ribeirinhos do Pantanal já sofriam com seu impacto
Para os pesquisadores e também para os ribeirinhos,
está foi uma cheia muito diferente das que foram registradas em anos
anteriores, além do alto nível dos rios em algumas regiões, a inundação da
planície este ano surpreendeu também pelo tempo de duração.
De acordo
com Vanessa Spacki, uma das pesquisadoras envolvidas no “Plano de Prevenção,
Mitigação e Adaptação a Impactos de Eventos Climáticos Extremos no Pantanal”,
está cheia chegou com atraso e teve a duração maior, ou seja, uma enchente
lenta e longa.
“Durante
a execução do projeto (Mapeamento de eventos climáticos extremos no Pantanal,
análise de seus efeitos sobre populações vulneráveis, capacitação local e
elaboração de propostas mitigatórias) pela Ecoa, realizamos um levantamento
sobre as cheias dos últimos seis anos e em nenhuma região houve uma cheia desta
proporção,” explica a pesquisadora, Mestre em Conservação da Biodiversidade e
Desenvolvimento Sustentável.
O
Pantanal possui um sistema hidrológico complexo – regido por ciclos de
enchentes, cheias vazantes e secas –, mas esta complexidade se agrava
atualmente. De acordo com o registro dos níveis do Rio Paraguai e seus
tributários, a planície continua inundada em um período em que a vazão já
deveria ter ocorrido.
Segundo
os dados do Serviço de Sinalização Náutica do Oeste, que acompanha o nível dos
rios Paraguai e Cuiabá, no início de setembro a régua de Bela Vista do Norte –
localizada no extremo norte de Mato Grosso do Sul, quase na divisa com Mato
Grosso – registrou 4,86 metros contra 4,04 metros do mesmo período no ano de
2011.
Se
analisado os dados do nível do pico da cheia do rio Paraguai na região – que
ocorreu no dia 13 de junho –, quando foi registrado o nível de 6,30 metros e no
dia 01 de setembro a altura da régua marcava 4,86, houve uma vazão de apenas
1,44 metros em 111 dias.
A lenta
vazão se manifesta mais claramente na sub-região pantaneira do Nabileque que
além do rio Paraguai, absorve também a água dos afluentes: Miranda, Aquidauana,
Taquari, Negro e Abobral.
Porto
Murtinho, distante 444 quilômetros de Campo Grande (MS), é a última cidade do
Pantanal na porção brasileira e lá se encontra a última régua do Serviço de
Sinalização Náutica do Oeste, onde o pico foi de 7,16 metros em 19 de junho no
dia 24 de setembro, registrou a altura de 6,73 metros; uma vazão de apenas 0,43
centímetros.
Esta
situação anormal preocupa moradores e pesquisadores, pois caso a água acumulada
na planície se mantenha até o início do período de chuvas, que deve ocorrer a
partir do próximo mês, esta situação será ainda mais alarmante.