quinta-feira, maio 29, 2014

Corredores ambientais na RMC aumentam a área preservada de floresta e permitem que animais circulem em segurança

Estagiária Gabriela Troian, sob a orientação de J.G. Alves
Tempo úmido é característico do litoral
Considerada como hotspot mundial, ou seja, uma das áreas mais ricas em biodiversidade e mais ameaçadas no planeta, a Mata Atlântica é, sem dúvidas, o bioma brasileiro mais impactado. Segundo dados da Fundação SOS Mata Atlântica, restam somente 8,5 % da área remanescente de floresta. Hoje, 27 de maio, comemora-se o Dia Nacional da Mata Atlântica, e mesmo em alerta, corredores ambientais dão sobrevida a regiões interioranas.
A maior parte preservada da floresta encontra-se na costa litorânea, mas devido ao terreno acidentado por montanhas e serras, a ocupação é dificultada. A área mais impactada está nas regiões interioranas, onde se encontra cerca de 62% da população brasileira. E além de grande parte dessa área ter sido desmatada (para dar lugar a ocupações urbanas, em sua grande maioria), as características florestais entre o litoral e o interior são diferentes, explica Márcia Rodrigues, analista ambiental do projeto Corredor das Onças, do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
Márcia Rodrigues, do projeto Corredor das Onças
“Na região da serra do mar, que não está ocupada, não há seca, então as plantas não se impactam tanto como no interior, que apresenta um período de seca mais demarcado e muda a fisionomia das matas. Estas dependem muito mais de animais dispersores para sobreviver”, avalia. E para que a mata continue viva também no interior, Márcia Rodrigues encabeça o projeto do Corredor das Onças. Para tanto, analisou a região da bacia PCJ, que compõem os rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí e seus afluentes, na Região Metropolitana de Campinas (RMC).
Estes estudos identificaram os fragmentos de mata espalhados pela região e que poderiam formar áreas de corredores ambientais. Também se constatou a presença de onças pela RMC. “Ter onças pela região é sinônimo de que há um grande potencial de conservação. Nosso intuito é conectar estes fragmentos para que os animais transitem em segurança”, afirma Rodrigues. Daí a razão destes animais terem-se tornado o símbolo do projeto. Apoio à iniciativa
Roberto Schneider mostra a diferença do antes e depois em sua propriedade: 15 anos de trabalho árduo
Até o momento, foram identificadas 110 propriedades que possuem fragmentos. Juntos, totalizam 34 mil hectares. Márcia Rodrigues explica que a próxima fase do projeto é a de “convencer” os produtores rurais da importância que essas áreas têm para a conservação do bioma. “Ganhamos como aliado o CAR (Cadastro Ambiental Rural) em que os proprietários de terra devem ter áreas florestadas em suas propriedades. Mostramos a importância do plantio, como será o trabalho do corredor e também auxiliaremos com o reflorestamento”, ressalta.
Diante do fato de que 80% das áreas de Mata Atlântica preservada se encontram em áreas particulares e de Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs), Mario Mantovani, ambientalista e diretor de Mobilização da Fundação SOS Mata Atlântica, acredita que com as novas regras e prazos o CAR pode se tornar sim um aliado à preservação destas propriedades. Mas faz uma ressalva: “O Cadastro Ambiental Rural pode ajudar na conservação e no reflorestamento se houver um monitoramento eficaz dos governos e municípios”, diz.
Das 110 propriedades identificadas na região, 60 já aderiram ao projeto. Este é o caso do produtor rural Roberto Eduardo Schneider, que desde 1999 possui um sítio de 4,4 hectares, localizado na cidade de Cosmópolis. “Quando cheguei, era tudo um grande pasto. Aí comecei a plantar e hoje vejo tucanosveado-campeiroteiú e muitos pássaros da varanda de minha casa”, aponta a diferença após 15 anos de labuta em suas terras.
Marco Antônio Pacheco segue os passos de outros produtores e aposta na mata viva
Da mesma forma que Schneider, o também produtor rural Marco Antonio Cintra Pacheco reflorestou por conta própria sua propriedade de 11 hectares, herança pelo pai, na cidade de Artur Nogueira. “Não se tinha essa consciência, pois se criava gado. Eu via a nascente descuidada e plantei algumas mudas doadas pela prefeitura e já noto a diferença. Além de muito mais bonito, antigamente se tinha muita enxurrada, agora não tem mais”, conta Pacheco.
A presença de animais e a falta de enxurradas em áreas próximas a rios já são reflexo do reflorestamento e da formação de corredores ambientais, aponta Márcia Rodrigues. “Preservar estas áreas auxilia na circulação da fauna, que transita em segurança. Os animais, como macacos, dispersam as sementes, auxiliando na manutenção das árvores e aumentando a diversidade genética. E, por estar em áreas ligadas a nascentes e rios, a água fornecida à região terá uma qualidade muito melhor”, avalia a analista ambiental.
Marco Antonio Cintra Pacheco pretende reflorestar mais uma parte de sua propriedade, para ligá-la a uma área próxima ao Rio Pirapitingui e, assim, formar um corredor ambiental e aumentar ainda mais a preservação em suas terras. Como ele, os demais produtores contarão com a orientação do projeto e compensação ambiental (onde empresas privadas investem na recuperação de áreas verdes, geralmente em função de provocar algum tipo de degradação por obras realizadas).
Onças são o aval para viabilizar iniciativa
Márcia Rodrigues ressalta que pequenas regiões isoladas não cumprem a função total da preservação, pois para contabilizarem como integrantes do bioma devem ter uma área acima de três hectares. “Um fragmento pequeno não abriga uma população diferenciada, mas se eles se unem, juntos podem aumentar muito mais a diversidade de plantas e animais”, reconhece.

quinta-feira, maio 22, 2014

Tatu-canastra: o engenheiro ambiental indispensável para o ecossistema
por Fábio Paschoal em 25 de outubro de 2013
Tatu-canastra (Priodontes maximus) – Foto: Projeto Tatu-Canastra
Encontrado em quase toda a América do Sul, o tatu-canastra é o maior membro de sua família (Dasypodidae). É um animal robusto, dotado de enormes garras que servem para cavar buracos em busca de formigas e cupins. Seu corpo é coberto por uma carapaça coriácea que o protege contra predadores. Pode pesar até 50 quilos e chega a medir 1,5 metro de comprimento (incluindo a cauda).
Apesar de seu tamanho e de sua grande área de distribuição é um animal raro de ser observado. A espécie é visada por caçadores e o desmatamento está destruindo o seu habitat. Além disso, passa a maior parte do tempo embaixo da terra. Há quem diga que é uma criatura mitológica, outros acreditam que não exista mais. Hoje se encontra na categoria vulnerável da lista vermelha de animais ameaçados de extinção da IUCN (União Internacional para a Conservação da Natureza, na sigla em inglês), mas oprojeto Tatu Canastra, uma iniciativa do Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ) e da Royal Zoological Society of Scotland, está tentando mudar essa história.
Um estudo realizado por Arnaud Desbiez, biólogo e coordenador do projeto, e pelo médico veterinário Danilo Kluyber,  revelou que o tatu-canastra altera o ambiente, muda a disponibilidade de recursos para outras espécies e, por isso, é considerado um engenheiro do ecossistema indispensável para o meio ambiente.
Jaguatirica na toca do tatu-canastra – Foto: Projeto Tatu-Canastra
O animal cava túneis para dormir ou procurar comida. As tocas podem atingir 5 metros de profundidade e 35 centímetros de largura. Esses buracos são utilizados por outros animais como refúgio térmico, abrigo contra predadores e área de alimentação e descanso. Pelo menos 24 espécies de vertebrados se beneficiam dos novos habitats criados pelos canastras.
A pesquisa também indica que as tocas podem ser importantes aliadas dos animais contra o aquecimento global. A temperatura do interior dos buracos se mantém constante em 24°C. “Com as mudanças climáticas e a tendência das temperaturas aumentarem, as tocas de tatu-canastra podem ajudar as espécies a sobreviverem a essas mudanças e temperaturas extremas”, diz Desbiez.
Os gigantes encouraçados são extremamente importantes para a manutenção de um ecossistema saudável e sua extinção causaria um desequilíbrio nos habitats onde são encontrados. Assim, o Projeto Tatu Canastra segue com as pesquisas e luta pela conservação da espécie.


Arnaud Desbiez (esquerda) e Danilo Kluyber (direita) – Foto: Projeto Tatu-Canastra
Quatis procuram por comida no monte de terra deixado pelo tatu-canastra na entrada da toca – Foto: Projeto Tatu-Canastra
Lobinho dormindo em toca de tatu-canastra – Foto: Projeto Tatu-Canastra
Cutia saindo de uma toca de tatu-canastra – Foto: Projeto Tatu-Canastra
Cateto entrando na toca do tatu-canastra – Foto: Projeto Tatu-Canastra
O tamanduá-mirim também usa os túneis feitos pelo tatu-canastra – Foto: Projeto Tatu-Canastra
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quinta-feira, maio 08, 2014

O que o Fuleco fez pelo tatu-bola?
Mascote da Copa de 2014 é espécie encontrada apenas no Brasil, mas até agora, não se beneficiou com o título

Estagiária Gabriela Troian sob a orientação de Valéria Forner
Formato da carapaça do tatu-bola facilita a caça predatória

Para chegar ao posto de mascote da Copa do Mundo de 2014, o tatu-bola (Tolypeutes tricinctus) enfrentou uma disputa com a onça-pintada, a arara-azul e o jacaré. Das 11 espécies de tatu que ocorrem no Brasil, é a única endêmica. A situação do tatu-bola, ameaçado de extinção, não melhorou desde setembro do ano passado, quando houve a eleição da mascote. As áreas onde a espécie ocorre continuam sendo desmatadas, comprometendo, assim, a sobrevivência do animal.
Espécie é a única endêmica de tatus no Brasil
Ao apresentar o tatu-bola como candidato a mascote aos membros da Federação Internacional de Futebol (Fifa), a Associação Caatinga, organização não governamental, fez uma lista de justificativas. Entre elas se destaca o fato de o tatu-bola ser espécie que existe apenas no Brasil, nas áreas de Caatinga e Cerrado, e estar ameaçada de extinção. Outra característica é o formato de bola que o animal assume, quando se sente ameaçado.
Desde a escolha da mascote, aumentou a visibilidade para o projeto “Tatu-bola: Marcando um gol pela sustentabilidade”. No entanto, não foram desenvolvidas medidas de preservação. Biólogo da Associação Caatinga, Rodrigo Castro afirma que ainda há muitas pessoas que não associam o Fuleco, nome dado à mascote, ao tatu-bola, e desconhecem o risco de a espécie desaparecer.
                                          Rodrigo Castro luta pela preservação na Caatinga
O personagem Fuleco é facilmente encontrado em comerciais, sites e até em álbuns de figurinhas. Mas e o tatu-bola de verdade? Diferentemente da mascote, refugia-se em áreas bem preservadas que ainda restam no País, como a RPPN Serra da Alma, entre as cidades de Crateus (CE) e Buriti dos Montes (PI). A presença do Tolypeutes tricinctos, vale dizer, sinaliza a boa saúde dos biomas.Tamanha importância motivou a Fifa a agregar a palavra “futebol” à “ecologia”. Por isso o nome Fuleco. Rodrigo Castro afirma que durante reuniões realizadas com o comitê organizador do evento esportivo e o Ministério do Meio Ambiente, não houve apelo maior para conscientizar as pessoas sobre a possibilidade de extinção. “O tatu-bola deu vida ao Fuleco, mas o que ele realmente fez pelo tatu-bola? O compromisso de preservação termina justamente no nome”, observa o biólogo.
Entre os dias 12 e 16 de maio será desenvolvida uma oficina de elaboração do Plano de Ação Nacional (PAN) de conservação do Tatu-bola, iniciativa do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e da Associação Caatinga. Com a participação de pesquisadores, o PAN tem a proposta de traçar metas para a preservação da espécie pelos próximos cinco anos. O sumário deve ser concluído até o final da Copa, em julho.